O avanço da tecnologia e a popularização das criptomoedas trouxeram novas possibilidades de investimento, mas também facilitaram a ocorrência de fraudes financeiras e golpes cada vez mais sofisticados. O estelionato envolvendo falsas promessas de altos rendimentos com bitcoins se tornou uma prática comum, especialmente contra indivíduos vulneráveis, como idosos, contra os quais os golpistas conquistam a confiança e os induzem a transferir uma quantia significativa para contas sob seu controle.
Como ainda há uma escassez de regulamentação e fiscalização do uso de criptomoedas no cenário jurídico brasileiro, o escritório DELIVAR DE MATTOS & CASTOR entende que é necessário reforçar constantemente a conscientização sobre os riscos das transações digitais e a importância de medidas preventivas para garantir a segurança em tais operações, a fim de que os cidadãos, especialmente os mais vulneráveis, tomem decisões mais seguras e acertadas sobre seus investimentos.
Homem Condenado por Estelionato ao Aplicar Golpe com Bitcoin em Idosa.
A educação digital e políticas públicas são medidas extremamente necessárias para o combate às fraudes virtuais. Isso fica muito claro no caso julgado recentemente, 05 de fevereiro de 2025, pela 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que confirmou, em parte, a decisão da Vara Única de Cananéia (SP), que havia condenado um homem por estelionato ao enganar uma idosa com um falso investimento em bitcoins (Autos nº 1500148-39.2021.8.26.0118).
Entenda o Caso
O condenado ofereceu à vítima um investimento fraudulento, prometendo altos rendimentos em curto prazo. Confiando na proposta, a idosa realizou os depósitos, mas, ao tentar resgatar os supostos lucros e o valor investido, foi informada de que não poderia reaver seu dinheiro.
Diante da situação, o caso foi levado à Justiça, resultando na condenação do réu, que interpôs recurso de apelação, julgado pela 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), sob relatoria do Desembargador Guilherme de Souza Nucci.
Conforme consignado no voto do Desembargador Guilherme de Souza Nucci, o réu era colega de trabalho da idosa e lhe prometeu grande lucro em três meses. Quando ela solicitou o resgate do seu investimento e recebeu a negativa do réu, a idosa o convidou para comparecer em sua residência para realizarem um acordo, vez que ela estava passando por um tratamento de câncer e precisava de dinheiro, já que estava sem trabalhar, sendo que seu marido também estava desempregado. Porém, nada lhe foi ressarcido. Explicou na delegacia que não formalizou por escrito o acordo sobre o investimento, pois o réu era seu amigo e ela confiava nele. A idosa ainda relatou que outras duas pessoas do seu trabalho foram vítimas do mesmo golpe aplicado pelo réu. Para piorar, contou que o dinheiro que ela deu ao réu para o investimento era de sua reserva de emergência, composta por dinheiro seu e de seus filhos.
O réu negou a prática delitiva, e disse ter aplicado o dinheiro na corretora FOREX, em seu próprio CPF. Contudo, não obteve lucro, perdendo todo o dinheiro que recebera. Disse que a vítima tinha ciência do risco do negócio. Também informou ser operador de máquinas concursado, ofício pelo qual aufere a renda mensal de R$ 3.500,00 e destacou não possuir formação no mercado financeiro, mas tão somente
conhecimento por meio de cursos e leituras online.
A Decisão do Tribunal
No julgamento do recurso de apelação interposto pelo réu, a condenação por estelionato foi mantida e apenas o cálculo de penas foi revisto. Restou fixado o regime aberto para início da reprimenda corporal e redimensionada a pena restritiva de direito por prestações pecuniária em favor de entidade pública ou privada com destinação social, ficando redimensionada ao patamar de 5 salários-mínimos (em substituição aos 10 salários-mínimos fixados em sentença), tendo em vista que o réu aufere renda de apenas R$ 3.500,00 por mês, além de prestação de serviços à comunidade. Além disso, o condenado deverá ressarcir a vítima em R$ 8,5 mil.
O relator do caso ressaltou que:
“Não bastasse, o recorrente não soube explicar quais “problemas com seu CPF” suportou, que o impossibilitaram de realizar o resgate dos valores entregues pela ofendida, tampouco apresentou aos autos quaisquer documentos comprobatórios do suposto prejuízo financeiro próprio suportado por ele.
Frisa-se, ainda, que o acusado ofertou versões diferentes na delegacia e em juízo, divergência que macula a confiabilidade de seus relatos. Isso porque, em sede distrital, o recorrente aduziu que “devido a problemas particulares, não houve rendimentos” (fls. 10), além de ter se proposto a devolver o dinheiro da vítima. Em sede judicial, por sua vez, imputou à oscilação de mercado a perda dos valores da ofendida.
(…)
Agindo dessa maneira, com clara intenção fraudulenta, induzindo a erro a vítima envolvida no suposto negócio jurídico para a obtenção de vantagem financeira ilícita, o apelante praticou a conduta descrita no tipo penal do art. 171, caput, do Código Penal, conforme bem delineado na sentença recorrida, devendo, pois, ser mantido o édito condenatório.”
Pontos de atenção
É importante que as pessoas entendam que golpes desse tipo podem levar inclusive meses ou anos até a sua concretização. Isto porque os golpistas sabem que precisam conquistar a confiança das vítimas e isso demanda tempo e até mesmo investimento financeiro, por vezes. Não é em vão que este tipo de golpe é conhecido como “engorda porco”.
Um exemplo marcante desse tipo de golpe, foi o caso do idoso Jim Wilkerson, um americano de mais de 74 anos, que perdeu mais de R$ 3.6 milhões e compartilhou sua história justamente para prevenir que futuras vítimas caiam em fraudes com criptomoedas.
Conforme relatado no site da LIVECOINS, o idoso perdeu todo esse dinheiro em um esquema de investimento que descobriu por meio de um contato no LinkedIn. Sua tragédia financeira iniciou com uma promessa de altos retornos de 24% ao mês.
Atraído pela possibilidade de grandes lucros, acabou transferindo seu dinheiro para uma plataforma de negociação de criptomoedas, que posteriormente foi investido na empresa fictícia Sundell-fx.
O detalhe é que inicialmente, o Sr. Wilkerson conseguia sacar os lucros. Isso é feito justamente para a pessoa acreditar na legitimidade da empresa. Porém, quando ele investiu mais dinheiro no negócio e tentou sacar sua parte, foi confrontado com alegações de possível lavagem de dinheiro, quando, então, foi orientado a transferir 10% do seu saldo para um endereço específico sob justificativa de um processo de verificação. Foi aí que Wilkerson se recusou a cumprir as exigências e seu saldo desapareceu, ficando com um prejuízo milionário.
Essa é a lógica desse tipo de golpe, deixar a vítima confiante, processo de “engorda”, para depois criar uma situação crítica, como a necessidade urgente de fundos, para que a vítima disponha de mais valores e, no ápice, o golpista some com o investimento. Ou seja, há uma inegável expertise desses golpistas em manejar o emocional das vítimas.
Vale frisar que qualquer pessoa pode ser vítima de um golpe assim, não só idosos. Para se proteger é necessário ter cautela com contatos novos, ainda mais quando online, verificar a legitimidade de qualquer oportunidade de investimento antes de começar a investir qualquer coisa.
No caso mencionado, a LIVECOINS relatou que “o Departamento de Instituições Financeiras do Estado de Washington já emitiu um alerta sobre a Sundell-fx. Além disso, o FBI destaca que fraudes de investimento como esta são cada vez mais comuns, com vítimas relatando perdas de mais de US$ 3,3 bilhões em 2022.
O FBI adverte que os golpistas frequentemente utilizam mídias sociais e plataformas de rede para atrair vítimas, e a transferência de fundos para criptomoedas aumenta o risco devido à falta de regulamentação.”
Em outro caso semelhante, narrado pela BBC, a vítima foi um empresário britânico, Naveed Saghir, de mais de 44 anos, graduado e mestre em Ciências da Computação, que perdeu a mesma quantia que o Sr. Wilkerson em bitcoins.
A BBC ainda apresentou as recomendações de Lisa Forte, que trabalha para a empresa de cibersegurança Red Goat Cyber Security:
“Primeiro, pesquise o que quer que você faça para colocar seus ativos. Existem muitas fontes confiáveis.
Dois, entenda o que é bitcoin, como você deve fazer com qualquer investimento; pesquise como funciona e conheça os prós e os contras.
Terceiro, se alguém disser que pode usar seu investimento para obter um grande lucro em um curto espaço de tempo, é nessa hora que o alarme deve soar. Plataformas de investimento legítimas não fazem esse tipo de promessa.”
Como se pode observar, em relação a investimentos financeiros, ainda mais os relacionados a criptomoedas, todo o cuidado é pouco, principalmente porque ainda não há regularização e fiscalização suficientes e eficazes para prevenir e tratar situações como essas e, mais difícil ainda se torna o caso, quando envolve jurisdições diferentes. Veja-se que no caso brasileiro que abordamos inicialmente, a idosa, vítima do golpe, precisou recorrer ao Poder Judiciário para conseguir a tutela de seus direitos; isso envolve dispêndio de tempo e dinheiro, em uma situação em que a vítima já está vulnerável, deixando tudo mais complicado.
A decisão da 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo reforça a necessidade de um olhar atento sobre crimes de estelionato, especialmente aqueles que exploram a vulnerabilidade de vítimas idosas. O avanço da tecnologia trouxe novas oportunidades de investimento, mas também abriu espaço para práticas fraudulentas, exigindo maior rigor na responsabilização dos envolvidos. É por isso que o escritório DELIVAR DE MATTOS & CASTOR ADVOGADOS, liderado pelos sócios Rodrigo Castor de Mattos e Analice Castor de Mattos, destaca a relevância da assessoria jurídica séria e competente para a prevenção e a defesa em casos de estelionato e crimes financeiros.
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https://www.bbc.com/portuguese/geral-58595198