Terceira Turma permite rescisão de pacto de exploração ambiental por violação da boa-fé objetiva

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) que, apesar de reconhecer violação da boa-fé objetiva em contrato acessório de exploração sustentável de área ambiental, rejeitou o pedido para a sua resolução, sob o argumento de que ainda seria possível mantê-lo, apenas determinando que o responsável cumprisse suas obrigações para licenciamento da área perante os órgãos ambientais.

Para a turma julgadora, a decisão do TJMT extrapolou os limites da petição inicial – em que não houve pedido de cumprimento do contrato –, violando o artigo 475 do Código Civil, segundo o qual a parte lesada pode pedir a resolução do contrato caso não prefira exigir-lhe o cumprimento – cabendo, em qualquer caso, indenização por perdas e danos.

De acordo com os autos, foi celebrado um contrato de compra e venda de área rural, no qual ficou estabelecido, por meio de pacto acessório, que os vendedores poderiam explorar de forma sustentável uma região de floresta. Em contrapartida, eles abateram do valor do imóvel o montante que seria potencialmente obtido com essa exploração.

Entretanto, segundo os vendedores, o comprador, logo após a celebração do contrato, passou a frustrar o cumprimento do pacto, deixando de assinar documentos essenciais para a obtenção de licenças nos órgãos ambientais e, assim, impedindo-os de explorar licitamente a área.

Para o TJMT, o contrato não deveria ser rescindido

Em primeiro grau, o juiz reconheceu a violação de cláusula adjeta de arrendamento florestal, em razão da omissão do comprador em atender o dever de colaboração e cooperação. Por isso, o magistrado condenou o réu à obrigação de assinar todos os documentos relativos às fases de aprovação ambiental, no prazo de 15 dias, sob pena de multa de R$ 10 mil por dia.

Ao manter a sentença, o TJMT afirmou que o fato de não haver relação cordial entre as partes não é motivo suficiente para pôr fim ao contrato. Embora a petição inicial tivesse como pedidos exclusivos a resolução parcial do contrato – especificamente em relação à exploração florestal – e o pagamento de indenização referente ao valor da área que seria explorada, a corte estadual entendeu que o cumprimento do acordo ainda era possível, bastando forçar o comprador a cumprir suas obrigações perante o órgão ambiental.

Dever de lealdade e respeito à confiança entre as partes contratantes

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso dos vendedores, explicou que a boa-fé objetiva constitui uma exigência de lealdade, impondo que cada parte se comporte de forma honesta, escorreita e leal, em conformidade com um padrão ético de confiança, a fim de permitir a concretização das legítimas expectativas que justificaram a celebração do acordo de vontades.

“O ordenamento jurídico, nesse contexto, repele a prática de condutas contraditórias, impregnadas ou não de malícia ou torpeza, que importem em quebra da confiança legitimamente depositada na outra parte da relação contratual”, completou a ministra.

No caso dos autos, Nancy Andrighi apontou que, como os autores da ação não pediram o cumprimento do acordo, o TJMT, após reconhecer a violação de dever contratual, não poderia atribuir consequência jurídica diferente daquela pleiteada na petição inicial, sob pena de violação ao princípio da congruência.

“Dessa forma, impõe-se a conclusão de que o tribunal de origem – ao deferir pedido não formulado pelos autores da ação – extrapolou os limites fixados na petição inicial, em afronta ao artigo 492 do Código de Processo Civil de 2015”, afirmou.

Em seu voto, a relatora ainda observou que o tribunal mato-grossense, ao entender que o inadimplemento do comprador não deveria resultar na resolução parcial da avença, ofendeu igualmente o artigo 475 do Código Civil.

“Por derradeiro, como corolário do reconhecimento do inadimplemento parcial da avença, que acarretou prejuízo econômico aos recorrentes, impõe-se ao recorrido a obrigação de reparar os danos materiais causados, cujo montante deve ser apurado pelo juízo de primeiro grau em liquidação de sentença, por arbitramento”, concluiu a ministra.

 

Fonte: STJ

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