Ao julgar o Recurso Especial nº 2.178.201/RJ (2024/0402390-1), interposto pela Fazenda Nacional, cujo acórdão foi publicado em 16 de maio de 2025, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos e sob a relatoria do Ministro FRANCISCO FALCÃO, deu parcial provimento ao recurso fazendário para reconhecer a prescrição dos créditos de PIS/COFINS indicados nas PER/DCOMP protocoladas após a data de 08/09/2022 pelo contribuinte.
A referida decisão destoa do entendimento que a própria Segunda Turma do STJ vinha propondo há anos, aproximando-se da jurisprudência da Primeira Turma, tanto que o Ministro Falcão propôs seja realizado o overruling, o que significa, de forma simplificada, a alteração de entendimento do Tribunal ou órgão julgador a respeito da mesma questão/norma jurídica.
Mas o que exatamente mudou?
O DELIVAR DE MATTOS & CASTOR esclarece as alterações para você.
Como bem ressaltado pelo próprio Ministro Falcão, antes de tudo, é prudente relembrar qual é a sistemática do procedimento da compensação tributária. Basicamente, após o trânsito em julgado de ação judicial que reconhece o direito à compensação ou restituição tributária (restituição de indébito), ou seja, que reconhece que o contribuinte pagou a maior ou indevidamente algum tributo e, portanto, adquire o direito a ser restituído ou de compensar este indébito/crédito, o contribuinte precisará submeter ao Fisco o pedido de habilitação deste crédito. Esta é uma fase prévia para que a Receita confirme a liquidez e certeza do crédito a ser compensado. Se deferida a habilitação, o contribuinte passa a poder transmitir o seu PER/DCOMP, que é quando efetivamente compensa seu indébito com seus débitos.
Pois bem.
A Segunda Turma do STJ entendia, até a decisão ora analisada, que a repetição do indébito tributário (direito de restituição/compensação) era imprescritível, pois a lei fala em prazo prescricional de 5 anos para solicitação de repetição de indébito, conforme artigo 168, inciso I do Código Tributário Nacional (CTN), que prevê a extinção do direito de pleitear a restituição com o decurso do prazo de 5 anos, contados da data da extinção do crédito tributário, sendo a decisão judicial transitada em julgado, uma das formas de extinção do crédito tributário, nos termos do artigo 156, inciso X do mesmo diploma.
Na prática, então, para a Segunda Turma, se a decisão judicial transitasse em julgado em 10/06/2025, o contribuinte poderia pleitear a compensação/habilitar-se até 10/06/2030 e, a partir dali, aproveitar/compensar o crédito sem prazo, até ele se esgotar.
Para ficar mais claro, vamos utilizar um exemplo fornecido no próprio acórdão objeto desta análise, citado em um dos precedentes da Segunda Turma referenciados no voto do Ministro FALCÃO:
“(…)
- É correto dizer que o prazo do art. 168, caput, do CTN é para pleitear a compensação, e não para realizá-la integralmente.
- Imagine-se, por exemplo, que o contribuinte tenha uma média anual de impostos a pagar no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais). Se o indébito reconhecido for de R$500.000,00 (quinhentos mil reais), é fácil antever que seriam necessários aproximadamente 10 (dez) anos para o integral exaurimento da sua pretensão. Não haveria, nesse contexto, como decretar prescrito o saldo não aproveitado nos primeiros cinco anos.
- Diferente seria a solução se, por descuido do contribuinte, o indébito hipotético de R$100.000,00 (cem mil reais) – que poderia ser compensado em apenas dois anos – não fosse integralmente aproveitado no lustro.
- Portanto, consoante adotado como ratio decidendi pelo Tribuna1 a quo, a verificação da inércia é imprescindível para concluir se o pedido de habilitação, formulado em 2008, foi ou não atingido pela prescrição (…)”[1]
Reapreciando a matéria, o Ministro FALCÃO entendeu, então, que na prática, o que a Segunda Turma estava admitindo é que o direito à restituição do indébito se tornou imprescritível, podendo ser exercido de forma indefinida, ao exclusivo critério do contribuinte, ou, ainda, a depender do montante reconhecido como indevido pelo Poder Judiciário.
É aqui, que vem mudança de entendimento!
A partir do julgamento do Recurso Especial nº 2.178.201/RJ, a Segunda Turma mudou de posicionamento, passando a entender que todas as PER/DCOMP precisam necessariamente ser transmitidas no prazo de 5 anos, a contar do trânsito em julgado, sendo admitida a suspensão deste prazo prescricional durante o lapso temporal entre o pedido de habilitação e o respectivo deferimento, nos termos do art. 82-A da Instrução Normativa n. 1.300/2012.
Foram destacados pelo Ministro FALCÃO dois pontos importantes para esta virada de entendimento:
“A imprescritibilidade decorrente do entendimento prevalecente nesta Segunda Turma incentiva o contribuinte a retardar ao máximo o aproveitamento do indébito, corrigido pela SELIC, cuja parcela não estará sujeita à tributação. Isso sem contar a privação de previsibilidade sofrida pela Fazenda Pública, que não saberá, ao certo, quando o contribuinte aproveitará o crédito.”
Ainda, sobre a (im)possibilidade de aproveitamento de todo o crédito por meio de compensações tributárias dentro do prazo de 5 anos, o ministro relator consignou que:
“(…)entendo razoável afirmar ser do interesse do contribuinte litigante a avaliação da forma pela qual submeterá a questão de direito à análise do Poder Judiciário, estando ciente de todas as limitações envolvidas quanto à recuperação do crédito. Cito, como exemplo, o contexto do mandado de segurança, no qual é admitida apenas a compensação tributária dos valores reconhecidos como indevidos, quando relacionados ao período anterior à impetração. Em hipóteses tais, deve o contribuinte pautar as suas escolhas considerando, inclusive, o montante previsto em caso de êxito na demanda, o que eventualmente sinalizará para o ajuizamento de uma ação submetida ao rito ordinário, ao invés da impetração do mandado de segurança, viabilizando assim a recuperação do crédito por meio de RPV e /ou precatório.
(…)”
No caso apreciado pela Segunda Turma, o contribuinte protocolou PER/DCOMP após a data de 08/09/2022, sendo que a habilitação fora protocolada perante a Receita Federal em 22/02/2013. A decisão judicial havia transitado em julgado em 24/04/2009, reconhecendo recolhimentos de PIS e COFINS pagos indevidamente em relação ao período de JAN/2001 a JAN/2004.
Quando impetrou o seu mandando de segurança, os argumentos da contribuinte foram os seguintes:
- os atos normativos da Secretaria da Receita Federal são normas secundárias impossibilitadas de inovar o mundo jurídico;
- não há previsão legal fixando tempo máximo para a finalização da compensação de indébitos tributários nos casos de decisão judicial transitada em julgado;
- prescrição de indébito tributário é matéria reservada à lei complementar, nos termos do art. 146, III, b, da CF;
- não é possível exigir planejamento tributário para garantir o aproveitamento de todo o indébito no prazo de 5 anos a contar do trânsito em julgado.
Ela ganhou em primeira e segunda instância, pois o TRF da 2ª Região, compartilhava do mesmo entendimento que a Segunda Turma também adotava, antes do Recurso Especial nº 2.178.201/RJ.
Contudo, como restou detalhado, no STJ o jogo virou, e o provimento parcial concedido a recurso da Fazenda reconheceu a prescrição dos créditos da contribuinte, em relação as PER/DCOMP protocoladas em 08/09/2022, sendo parcial o provimento porque a Segunda Turma entendeu que, ao contrário do que foi alegado pela Fazenda:
“tanto a Instrução Normativa n. 1.300/2012 quanto os demais atos normativos subsequentes que, igualmente, disciplinaram a compensação tributária estipulando o prazo máximo de 5 anos para transmissão da PER/DCOMP, a contar da data do trânsito em julgado, não inovam na ordem jurídica nem extrapolam os limites do poder regulamentar, na medida em que apenas refletem o disposto no art. 168 do CTN, no art. 1º do Decreto n. 20.910/1932 e no art. 74 da Lei n. 9.430/1996.”
Efeitos Práticos
A decisão do STJ, no Recurso Especial nº 2.178.201/RJ, traz um importante alerta para os contribuintes e para empresas que trabalham com prestação de serviços relacionados a recuperação de créditos tributários, pois a inércia no aproveitamento dos valores pode resultar na perda definitiva desse direito e, com toda a certeza, os contratos de prestação de serviços dessa natureza precisam levar em consideração o entendimento do STJ ou serem revisados, caso já vigentes.
O escritório DELIVAR DE MATTOS & CASTOR ADVOGADOS, atua na área tributária e empresarial há mais de 25 anos e entende o impacto que a alteração de entendimentos jurisprudenciais ou novo regramento pode produzir na vida econômico-financeira das empresas e contribuintes pessoa física, é por isso que, no que pese o Recurso Especial nº 2.178.201/RJ ainda não ter transitado em julgado (ainda há recursos sendo interpostos), já se sabe que, pelo menos, a Primeira Turma, já defendia este mesmo posicionamento. Ou seja, todos esses fatores, precisam ser levados em consideração pelo contribuinte, que deve se assessorado juridicamente com responsabilidade e comprometimento, por meio de estratégias que visem um planejamento tributário efetivamente sustentável, ou seja, pautado nos alicerces normativos mais sólido possíveis, considerando a constante oscilação da legislação tributária e da jurisprudência tributária no ordenamento jurídico brasileiro.
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Fonte: Inteiro teor Recurso Especial nº 2.178.201/RJ (2024/0402390-1): https://processo.stj.jus.br/processo/julgamento/eletronico/documento/mediado/?documento_tipo=integra&documento_sequencial=313254122®istro_numero=202404023901&peticao_numero=&publicacao_data=20250516&formato=PDF
[1] REsp n. 1.480.602/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 16/10/2014, DJe de 31/10/2014.