As mudanças climáticas e emissões de gases efeito-estufa (GEE) são alguns dos fatores que vêm sendo considerados no âmbito de indicadores de Environmental, Social and Governance (ESG), que hoje são levados em conta pelo mercado financeiro para análise de risco e retorno de investimentos, vez que funcionam como espécie de indicador de perenidade do negócio e longevidade de lucro de uma empresa.
Mas esse tão almejado indicador esperado pelos investidores tomadores de decisão padece de uma necessária base de comparação. E foi no sentido de preencher essa laguna que a U.S. Securities and Exchange Commission (SEC), agência responsável por proteger e regular o mercado de capitais americano, publicou recentemente (21/03), proposta de novas regras que exigem a divulgação padronizada de informações sobre como as empresas listadas, inclusive estrangeiras, estão se estruturando em relação a riscos relacionados a mudanças climáticas e emissões de GEE.
A padronização dos dados a serem divulgados pelas empresas tem como objetivo tornar a análise dos investidores sobre os potenciais riscos mais fácil e assertiva, fornecendo informações consistentes, comparáveis e confiáveis. A nova proposta de regulação da SEC surge exatamente com esse enfoque no que tange às questões relacionadas às mudanças climáticas.
Fica sob a responsabilidade da empresa demonstrar como quaisquer riscos identificados relacionados ao clima afetaram ou podem afetar a estratégia, modelo de negócios e perspectivas das empresas.
As empresas listadas terão que divulgar informações sobre: a supervisão e governança dos riscos relacionados ao clima pela diretoria e administração das empresas; como os riscos relacionados ao clima identificados pelas empresas tiveram ou podem ter um impacto material em seus negócios e demonstrações financeiras, os quais podem se manifestar a curto, médio ou longo prazo; quais foram os procedimentos utilizados para identificar, avaliar e gerenciar riscos relacionados ao clima e se tais procedimentos estão integrados ao sistema ou processos de gerenciamento de riscos gerais das empresas; e o impacto de eventos relacionados ao clima (eventos climáticos severos e outras condições naturais, bem como riscos físicos identificados pelas empresas) e atividades de transição (incluindo riscos de transição identificados pelas empresas) sobre os itens das demonstrações financeiras consolidadas das empresas e despesas relacionadas; e a divulgação de estimativas e premissas dos impactos financeiros por tais eventos.
Ainda, a proposta pretende exigir que as empresas divulguem informações sobre suas emissões diretas de GEE (Escopo 1) e emissões indiretas relacionadas ao consumo de energia (Escopo 2). Além disso, determinadas empresas deverão divulgar emissões de GEE de atividades que compõem sua cadeia produtiva (Escopo 3), se significativo para essa empresa (definição essa que ainda não apresenta critérios definidos) ou se a empresa tiver estabelecido uma meta de redução de emissões ou meta que inclua as emissões do Escopo 3. Esse ponto apresenta certa relativização e exceções por ser mais difícil de obter informações precisas.
A proposta passará por consulta pública nos próximos dois meses, até que seja elaborada sua versão final. De toda forma, ainda que a nova regulamentação seja aprovada em 2022, as medidas deverão ser aplicadas apenas em 2024, tendo como base as informações do ano fiscal completo de 2023.
No Brasil, também temos acompanhado o movimento internacional no que diz respeito a novas exigências para a divulgação de informações de práticas socioambientais e de ESG, com a publicação de novas regulamentações pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A mais nova exigência foi trazida pela Resolução CVM 59/21, publicada no fim do ano passado, a qual, dentre outras disposições, passou a exigir a divulgação de informações de companhias abertas, em seus respectivos formulários de referência, sobre práticas ESG (em formato “pratique-ou-explique”).
Dentre as principais novidades, a Resolução CVM 59/21 determina que as companhias abertas informem: se divulgam informações sobre indicadores de ESG (ou ASG, Ambiental, Social e Governança) em relatório anual ou outro documento específico, indicando o endereço eletrônico onde o relatório ou documento estará disponível para consulta; a metodologia ou padrão seguido na elaboração do relatório ou documento; se o relatório é ou não auditado ou revisado por alguma entidade independente, identificando o nome da referida entidade, em caso positivo; a matriz de materialidade, os indicadores-chave de desempenho ESG e os indicadores materiais do emissor; se o relatório ou documento considera os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela Organização das Nações Unidas e, em caso positivo, quais os ODSs relevantes para os negócios do emissor; se o relatório ou documento considera as recomendações da Força-Tarefa para Divulgações Financeiras Relacionadas às Mudanças Climáticas (TCFD) ou as recomendações de divulgações financeiras de outras entidades reconhecidas e que sejam relacionadas a questões climáticas; se o emissor realiza ou não inventários de emissão de GEE, identificando o escopo de emissões inventariadas e a página em que tais informações podem ser consultadas.
Caso a empresa não adote um dos critérios acima, deverá justificar. Além disso, a Resolução também inclui uma seção específica para prestação de informações a respeito da diversidade do corpo de administradores e empregados e previsão da abertura de informações por nível hierárquico, no caso dos empregados.
As novas exigências entram em vigor em 2 de janeiro de 2023. Contudo, considerando que a divulgação das informações em 2023 terá como base o exercício social de 2022, as empresas já precisam começar a se estruturar para a divulgação de tais informações.
Ainda que mais incipiente que a nova proposta da SEC, a determinação da CVM marca um passo importante para o avanço da agenda ESG no país. Mesmo sem o estabelecimento de padrões e critérios definidos de práticas e indicadores ESG, a exigência da divulgação de tais informações provavelmente começará a influenciar a forma como as ações ESG serão implementadas.
De toda forma, a nova regulação da SEC, caso aprovada, possivelmente refletirá no Brasil, vez que empresas brasileiras listadas nas bolsas americanas terão que se adequar e cumprir com as novas exigências. Além disso, com a crescente demanda de investidores, o desenvolvimento do mercado de carbono e diferentes formas de emissão de títulos verdes visando à redução de emissões de GEE, a tendência é que a parametrização de informações relacionadas a mudanças climáticas e emissões de GEE também chegue ao Brasil em breve.
Fonte: O Globo