Decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no REsp 2.124.423, de 19 de fevereiro de 2025, trouxe à tona questões cruciais sobre a responsabilidade das instituições financeiras em casos de fraudes digitais, particularmente em golpes como o “golpe do leilão falso”, que consiste em utilizar sites que imitam os padrões de leilões oficiais, simulando a oferta de produtos comumente leiloados e exigindo pagamento via depósitos digitais.
No caso enfrentado pela Turma, o entendimento foi de que os bancos digitais só serão responsabilizados quando houver falhas comprovadas no processo de verificação de identidade e na implementação de medidas de segurança, o que não se verificou, vez que o banco digital, conforme o TJSP já havia bem consignado, seguiu os procedimentos estipulados pelo Banco Central.
Um dos pontos destacados pelo tribunal de origem foi justamente o fato de a vítima do golpe não ter agido com cautela ao se deixar enganar por uma oferta 70% inferior ao valor de mercado do veículo.
O voto da ministra Nancy Andrighi, relatora do caso no STJ, foi acompanhado pela maioria, negando provimento ao recurso especial da vítima do golpe. Cumpre reproduzir a ementa do mencionado julgado por seu irretocável didatismo:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS. BANCO DIGITAL. CONTA DIGITAL. REGULAÇÃO. BANCO CENTRAL. GOLPE. INTERNET. MEIO ELETRÔNICO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS BANCÁRIOS. NÃO CONFIGURADA.
- Ação indenizatória por danos materiais ajuizada em 04/05/2021, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 17/05/2023 e concluso ao gabinete em 22/02/2024.
- O propósito recursal é decidir se houve defeito na prestação de serviço do banco digital no qual foi efetuado um pagamento por vítima do “golpe do leilão falso”, em razão da facilidade na criação de conta em meio eletrônico, que foi utilizada por estelionatários.
- O presente processo possui a peculiaridade de tratar da relação entre a vítima do estelionato e o banco em que foi criada a conta usada pelos estelionatários, instituição financeira da qual a vítima não é correntista. Por essa razão, aqui não se aplica o entendimento de que o banco deve criar mecanismos que obstem transações bancárias com aparência de ilegalidade por destoarem do perfil de compra de seus correntistas.
- A Resolução 4.753/19, do Banco Central, estabelece os requisitos a serem observados pelas instituições financeiras na abertura, manutenção e encerramento de conta de depósitos no meio digital. A Resolução não especifica as informações, procedimentos e os documentos necessários para abertura de conta, deixando sob responsabilidade da instituição financeira definir o que julga necessário para identificar e qualificar o titular da conta.
- As instituições financeiras têm a responsabilidade de verificar e validar a identidade e a qualificação dos titulares da conta, bem como a autenticidade das informações fornecidas pelo cliente, nos termos da Resolução 4.753/19, do Banco Central, além de deverem adequar seus procedimentos às disposições relativas à prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo.
- Se a instituição financeira não demonstrar que cumpriu com as diligências que dela se esperava, contrariando as regulamentações dos órgãos competentes, resta configurada a falha no dever de segurança.
- Destarte, independentemente de a instituição financeira atuar exclusivamente no meio digital, tendo ela comprovado que cumpriu com seu dever de verificar e validar a identidade e a qualificação dos titulares da conta, bem como a autenticidade das informações fornecidas pelo cliente, prevenindo a lavagem de dinheiro, não se vislumbra defeito na prestação do serviço bancário que atraia a sua responsabilidade objetiva.
- Recurso especial conhecido e desprovido, com majoração de honorários. [grifos nossos]
Portanto, não caracterizada a falha no cumprimento das diligências necessárias pela instituição financeira, ou seja, não constatada a falha no dever de segurança, não há que se falar em indenização.
Neste contexto, é essencial que as empresas, especialmente aquelas do setor financeiro, bem como os correntistas, compreendam seus direitos e deveres contratuais e legais, garantindo a segurança jurídica e a conformidade com as regulamentações do Banco Central, desta forma, evoluindo no combate à criminalidade digital e ilegitimidade em processos bancários.
O escritório DELIVAR DE MATTOS & CASTOR ADVOGADOS, liderado pelos sócios ANALICE CASTOR DE MATTOS e RODRIGO CASTOR DE MATTOS, atua há mais de 29 anos assessorando empresas e empresários nas áreas de direitos contratual, bancário, tributário e empresarial e buscando sempre aliar tradição e inovação, tem constantemente atualizado sua equipe sobre os desafios que o avanço tecnológico traz consigo, a fim de que a orientação aos nossos clientes tenha um olhar de 360º , focada não só no tratamento de problemas, mas igualmente na prevenção e mitigação de riscos. É por isso que conhecer as formas de ataques cibernéticos, compreender minimamente sobre engenharia social nesse contexto e se manter aberto para dialogar com outras áreas além da jurídica é essencial para uma advocacia moderna e eficaz. Acreditamos que isso vale para todas as empresas!
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